ASPECTOS AMBIENTAIS E LEGAIS
DA CONSERVAÇÃO DO PARQUE ESTADUAL DA SERRA DA TIRIRICA. ESTUDO DE CASO:
CÓRREGO DOS COLIBRIS,
NITERÓI, RJ, BRASIL
ENVIRONMENTAL
AND LEGAL ASPECTS OF THE CONSERVATION OF "SERRA DA TIRIRICA" STATE
PARK. CASE
STUDY: "CÓRREGO DOS COLIBRIS", NITERÓI, RJ, BRASIL
Ana
Angélica Monteiro de Barros[1]
Evandro
Bastos Sathler[2]
Jorge
Antônio L Pontes[3]
Maria
Collares Felipe da Conceição[4]
O
presente trabalho trata da tentativa de parcelamento de um trecho de Mata
Atlântica, localizado no Parque Estadual da Serra da Tiririca (Niterói,
Maricá/RJ) pela especulação imobiliária. Essa área apresenta várias espécies da
fauna e da flora ameaçadas de extinção. Os argumentos levantados pelos
empreendedores são totalmente frágeis do ponto de vista biológico e legal,
sendo estes comentados ao longo do trabalho. Cabe ressaltar que a mobilização
da sociedade civil impediu, ao menos temporariamente, a destruição do Córrego
dos Colibris.
The presente paper approaches the attempt of
developing a part of the Atlantic Forest, located on the boundaries of
"Serra da Tiririca" State Park (Niterói/Maricá/RJ). This area
presents several fauna and flora endanger species. Along this work we coment
the weak biological and legal arguments defended by the developers. Important
to demonstrate the civil mobilization that took place in defense of the
"Córrego dos Colibris" area, that temporarely - at least - stoped
developers to destroy a considerable amount of Atlantic Forest.
Recentemente a Empresa Imobiliária Mattos & Mattos, tentou conseguir junto as autoridades competentes, a liberação de um empreendimento imobiliário no Parque Estadual da Serra da Tiririca (PEST), especialmente na localidade conhecida como Vale do Córrego dos Colibris. Essa empresa se diz detentora dos direitos sobre áreas de propriedade da VEPLAN (Companhia de Desenvolvimento Territorial Ltda.), situadas na Região Oceânica do Município de Niterói (RJ) e hipotecada ao BIAPE (Banco Interamericano de Poupança e Empréstimo), com sede em Caracas, Venezuela.
A área em questão foi objeto de disputas passadas, onde ambientalistas, sociedade civil e a imobiliária procuravam valer seus argumentos, de um lado para a sua preservação definitiva e de outro para ocupação com condomínios de luxo. Foram elaborados pareceres técnicos baseados na Memória Descritiva Ambiental apresentada pela Mattos & Mattos aos órgão ambientais competentes pleiteando o licenciamento do empreendimento. Os mesmos foram protocolados na Fundação Instituto Estadual de Floresta (IEF/RJ), com o intuito de rebater os fracos argumentos dos empreendedores para justificar o empreendimento.
O presente trabalho trata deste assunto, apresentando dados ambientais e legais, irrefutáveis, baseados nos pareceres apresentados ao IEF/RJ para a negação de tal liberação, que seria altamente danosa ao meio ambiente e a toda sociedade civil, especialmente para as comunidades locais.
2.
ÁREA DE ESTUDOS
O
Parque Estadual da Serra da Tiririca é uma importante Unidade de Conservação
que fica localizada entre os municípios de Maricá e Niterói, RJ (22o48’–
3o00’ S e 42o57’- 43o02’ W), abrangendo uma
área de 2.400 ha (PONTES, 1987) (fig. 1). Foi criado em 29 de novembro de 1991,
pela Lei Estadual nº 1901/91 com o intuito de proteger a Mata Atlântica,
preservando a cobertura vegetal, as nascentes dos rios, riachos e fauna. A
denominação Serra da Tiririca se deve a passagem de tropas de burros para
comércio de mercadorias pelo caminho das tiriricas, plantas do gênero Cyperus da família Cyperaceae (BARROS
& SEOANE, 1999).
Fig. 1: Mapa com a localização
da área de estudo, Parque Estadual da Serra da Tiririca, Niterói / Maricá
RJ.
A Serra da Tiririca é formada
por oito morros: Morro do Elefante (412 m), Alto Mourão (369 m), Costão de
Itacoatiara (217 m), Morro do Telégrafo (357 m), Morro do Catumbi (325 m),
Morro do Cordovil (202 m), Morro da Penha (128m) e Morro da Serrinha (277 m).
Compreende as nascentes de rios das macrobacias da Região Oceânica de Niterói
(Rio João Mendes, Córrego Tiririca ou Colibri, Valão de Itacoatiara, Córrego da
Moréia, Córrego da Perereca Branca e Córrego Bebedouro dos Caranguejos), que
deságuam na Laguna de Itaipu; da Baía da Guanabara (Rio do Ouro, Rio Várzea das
Moças e Bacia do Rio Aldeia), que drenam para a Baía da Guanabara e os Rios
Inoã e Itaocaia, que drenam para Município de Maricá.
A cobertura vegetal compreende a Floresta Ombrófila
Densa, correspondente a Mata Atlântica Baixo-Montana ou Submontana, segundo
classificação de RIZZINI (1997). Muito da vegetação original foi alterada por
desmatamentos sucessivos. Restam ainda alguns fragmentos florestais nativos ou
com pouco grau de perturbação que ainda apresentam o microclima e a
biodiversidade da Mata Atlântica (Barros
& SEOANE, 1999).
O Vale do Córrego dos
Colibris é uma região coberta por vegetação secundária em processo de
regeneração há mais de 50 anos e inclui o Brejo das Pacas, que é uma área
alagadas associada à floresta.
O Córrego dos Colibris é perene e apresenta água cristalina, com uma seção média de 0,50 m, com profundidade de 0,15 m. Registra-se a presença do caranguejo de rio (Trichodactylus sp), um crustáceo que não tolera ambientes pouco oxigenados e/ou poluídos. Na região externa do Parque, o córrego foi canalizado, passando a receber esgotos domésticos, desembocando na Laguna de Itaipu (MULTISERVICE, 1995). Além disso, este curso d’água já sofreu muito com agressões passadas, como a retificação do seu leito. Tal ação foi promovida por antigos empreendedores que tentaram parcelar a área.
Apesar da área florestada
não corresponder à vegetação primária, esta abriga um valioso patrimônio
genético, representado pela flora e fauna bastante diversificadas, incluindo
espécies raras e em perigo de extinção.
Estudos preliminares estão sendo realizados no Córrego dos Colibris pela equipe
de botânica sistemática da UERJ-FFP (DCIEN). Esse trabalho registrou a presença
de algumas espécies consideradas vulneráveis e em perigo de extinção como o
pau-brasil (Caesalpinia echinata
Lam.), o cipó-escada-de-macaco (Bauhinia
smilacina (Schott) Steudel) e o caiapiá (Dorstenia arifolia Lam.) (SANTOS et al., 1998), além das raríssimas orquídeas terrícolas Corymborchis flava (Sw.) O. Kuntze e Houlletia brocklehurstiana Lindl.
(PONTES, no prelo).
Segundo PONTES (1987), a fauna do PEST abriga uma importante biodiversidade. Registrou a presença do ouriço-cacheiro (Sphiggurus insidiosus), o gato-do-mato (Herpailurus yagouarondi), cachorro-do-mato (Cerdocyon thous), o caxinguelê (Guerlinguetus igrami), a cutia (Dasyprocta aguti), as cuícas (Marmosa cinerea e M. incana), o gambá (Didelphis aurita), a irara (Eira barbara), o mão-pelada (Procyon cancrivorus), o mico-estrela-de-tufos-brancos (Callithrix jacchus), o micos-estrela-de-tufos-pretos (Callithrix penicillata), a paca (Agouti paca), a preguiça (Bradypus variegatus), o quati (Nasua nasua), o rato-espinhoso (Proechimys iheringi), o tatu-peba (Cabassous tatouay), o tamanduá-de-colete (Tamandua tetradactyla), entre outros.
A preservação da região é
ameaçada por diversas pressões antrópicas, tais como: especulação imobiliária,
caça, queimadas, desmatamento, monoculturas, mineração (Pedreira Inoã e
Saibreira da Av. Central), coleta ilegal de plantas ornamentais, turismo
desordenado e vandalismos (pichação de pedras e árvores) (BARROS & SEOANE,
1999).
3. HISTÓRICO DAS TENTATIVAS DE PARCELAMENTO DO VALE
DO CÓRREGO DOS COLIBRIS
Várias tentativas foram feitas com o objetivo de parcelar a área do Vale do Córrego dos Colibris. Abaixo estão relacionados os processos e os pareceres.
a)
Processo 80/01387/87 (PREFEITURA MUNICIPAL DE NITERÓI) - Projeto de plano integrado
das áreas C e D da gleba 5, situadas entre a Estrada de Itaipu, Rua Y (São
João) e Estrada do Engenho do Mato (900 mil m2) de propriedade da
VEPLAN. Essa área foi “adquirida” pela Ubá Imobiliária. Foi dado parecer
contrário ao empreendimento em 20 de fevereiro de 1989 pela Superintendência de
Meio Ambiente da Prefeitura de Niterói. O projeto foi cancelado pelo Decreto
Municipal 5611/89 de 22 de março de 1989. O empreendedor chegou a iniciar o corte da vegetação, mas as
ferramentas foram apreendidas em ação conjunta da fiscalização municipal, da
então Prefeitura Distrital da Região Oceânica e do Batalhão Florestal.
b)
Processo 18.026 (Ação Civil Pública) – Essa Ação foi movida pelo Curador de Justiça do Meio Ambiente e
do Patrimônio Comunitário, João Batista Petersen Mendes, em 06 de abril de
1987, sendo os réus a Prefeitura de Niterói e a Empresa Imobiliária Ubá. O
empreendimento seria instalado na área dos fundos das quadras 51 e 52. Uma
primeira licença para desmatamento foi dada pelo antigo IBDF/RJ. Para tal, o
empreendedor omitiu dados relevantes referentes a área em questão como: a)
ausência de curvas de nível definidas ou cotas altimétricas da planta da gleba
5; b) omissão da presença de cursos d’água, afloramento de lençol freático e do
Brejo das Pacas e c) ausência de demarcação dos paredões rochosos. A região consta como Reserva Florestal no
Registro de Imóveis do 13º Ofício no loteamento original “Cidade Balnearia de
Itaipu”. A sentença foi dada pelo Juiz José Carlos Maldonado de Carvalho em 11
de janeiro de 1994, condenando ambos os réus. Os réus apelaram (Apelação Cível
nº 3.039/94), contudo foi negado o pedido pelos Desembargadores Fernando
Whitaker (presidente) e Dalton Costa (relator) da 4º Câmara Cível, em 18 de
outubro de 1994. O loteamento também foi interditado pela deliberação CECA nº
2.353/91;
c)
Processo nº E-07/300067/95 (PREFEITURA
MUNICIPAL DE NITERÓI)- Em 9 de fevereiro de 1995 deu entrada no
IEF (Instituto Estadual de Florestas) outro projeto para empreendimento
imobiliário na gleba 5, no Córrego dos Colibris (pelo arquiteto José Henrique
Domingues. Foi elaborado um parecer contrário pela então administradora do
Parque Estadual da Serra da Tiririca, Laura França, e o processo foi indeferido
pelo presidente do IEF, na época o Dr. Antônio Carlos Prado;
d)
Processo nº 80/3040/94 (PREFEITURA MUNICIPAL DE
NITERÓI) - Ainda existe um processo
da Prefeitura de Niterói sobre outro empreendimento de parcelamento da área
compreendida pela Estrada do Engenho do Mato, Rua Y e Estrada de Itaipu. O
então Secretário de Urbanismo e Meio Ambiente, enviou um ofício ao IEF
consultando a esse respeito. Mais informações foram solicitadas por Laura
França, mas a Prefeitura não as forneceu. Esse processo encontra-se em trâmites
na Prefeitura de Niterói, sendo o seu último paradeiro a Secretaria de Meio
Ambiente de Niterói (CI 052).
e)
Processos nos 080/2682/96
e 080/004078/97 (PREFEITURA MUNICIPAL DE NITERÓI) – Atualmente existem dois processos
referentes ao Córrego dos Colibris em trâmites na Prefeitura de Niterói. A ONG
Protetores da Floresta solicitaram mais informações a esse respeito à
Secretaria de Meio Ambiente de Niterói, através da Curadoria de Justiça de
Niterói, na pessoa da Promotora de Justiça, Dra Adélia Barboza de
Carvalho. A resposta foi dada pelo Secretário Municipal de Meio Ambiente,
através do ofício nº 410/98 de 21/10/1998. Neste documento o Sr. Secretário
coloca o parecer permanece negativo referente aos processos em
questão. Atualmente esses processos encontram-se na Secretaria de Urbanismo de
Niterói.
Em
reunião do Conselho de Municipal de Meio Ambiente, da qual participaram os
conselheiros, ONG’s, moradores, instituições de pesquisa e os representantes da
Mattos & Mattos, foram expostos os argumentos de ambos os lados.
Pressionados pela comunidade presente os empreendedores retiraram o projeto de
parcelamento do Córrego dos Colibris. A mobilização da sociedade civil impediu
ou adiou mais uma vez a destruição de uma parcela importante do PEST.
3.
ASPECTOS AMBIENTAIS DE
PROTEÇÃO AO CÓRREGO DOS COLIBRIS
Alguns pontos devem ser destacados em referência à argumentação apresentada pelos empreendedores na Memória Descritiva Ambiental do Córrego dos Colibris. Segundo os mesmos “... com o lançamento em 1997 da pedra fundamental da sede do futuro Parque Estadual da Serra da Tiririca, na divisa com Maricá, percebemos que jamais o Parque necessitará de passagem por nossa propriedade...” (sic). Essa é uma observação não tem procedência, já que ainda não foi feito o Plano Diretor do PEST, que definirá as áreas específicas para cada tipo de usufruto. Cabe chamar atenção para o fato de que o PEST não se resume a área da sede. Trata-se de uma área florestada de 2.400 ha compreendida entre os Municípios de Niterói e Maricá (RJ).
Outra colocação refere-se a localização “a beira de rua já regularizada e habitada por condomínios com elevada taxa de ocupação...” (sic). Esta área corresponde ao loteamento original Cidade Balnearia de Itaipu de 1943, que inclui a Fazenda Itaipu, Fonte e Engenhoca (Córrego dos Colibris). A região compreendida entre a Rua Y (São João), Estrada do Engenho do Mato e Estrada de Itaipu, consta no Registro de Imóveis do 13º Ofício (Registro 1, livro 8) do loteamento original como RESERVA FLORESTAL. Esta Reserva é de domínio público, sendo insusceptível de alienação e protegida por lei. Esta área de Reserva Florestal foi ampliada para 12.532.400,00 m2 pela Lei 339 de 09/02/82 do Município de Niterói, segundo o Plano Estrutural de Itaipu.
Consta da Memória Descritiva Ambiental que “... Apesar do tamanho da propriedade 768.516,40 m2, só lotearemos menos de 15% da mesma, transformando o restante em Reserva Particular do Patrimônio Natural – RPPN...” (sic). Segundo o empreendedor, 65% dos lotes estariam em área sem restrições de acordo com o Plano Urbanístico de Niterói e de frente para ruas já regularizadas, habitadas e parte já asfaltada. Outros 30% dos lotes estariam em Zona de Restrição Urbana e os 5% restantes estariam em “área de especial interesse ambiental” (sic) que seriam as pontas de fundos dos lotes com divisa com a pretensa RPPN. Contudo, RPPN’s não podem ser criadas em áreas já protegidas por lei como Unidades de Conservação (UC), pois a RPPN também é uma UC (RODRIGUES, 1996).
O empreendedor levanta a questão da favelização da região “... Temos certeza que em termos de macrozoneamento do entorno do Parque da Serra da Tiririca, o loteamento em questão será de fundamental importância para preservar a Flora e a Fauna do Parque e impedir as tão conhecidas invasões por favelas. É importante aqui salientar que toda esta extensão (de Itacoatiara até o Vale Feliz) não sofre a pressão urbana da favelização devido à sua ocupação ordenada por Loteamentos e Condomínios de classe média alta. Qualquer forma de ocupação dessa região é danosa ao ecossistema, seja ela de classe alta, média ou baixa. O empreendedor tenta justificar seu loteamento dizendo que as demais áreas do Parque são ocupadas por “favelados”. Isso é um desrespeito com a população tradicional que ocupa as encostas da Serra com seus sítios. No Engenho do Mato, essas terras foram adquiridas da antiga Fazenda do Engenho do Mato, de propriedade da Sra Irene Sodré. Corresponde a posses muito antigas que foram incluídas no Plano de Reforma Agrária de 1962 (PEREIRA, 1962), através dos Decretos Estaduais 7.261/61, 7.577/61 e 7.832/62.
Outra
questão extremamente preocupante é que o loteamento “... fechará um cinturão
ocupacional ao encostar nas habitações já existentes do seu lado esquerdo, que
já se unem ao condomínio Ubá VI, indo até a beira da Praia de Itacoatiara. Pelo
lado direito ao Condomínio Ubá Floresta e consequentemente ao Vale Feliz.”
(sic). Este “cinturão ocupacional”
terá um efeito extremamente danoso sobre o PEST porque isolaria definitivamente
o fragmento florestal remanescente. Tanto a Serra da Tiririca, quanto as áreas
florestadas próximas, o que incluem os municípios de Maricá, São Gonçalo,
Saquarema, Araruama, Rio Bonito e Itaboraí, necessitam de intercâmbio gênico
para manutenção da sua biodiversidade. O “cinturão
ocupacional” é apenas um argumento frágil para maquiar o empreendimento
como “Loteamento Ecológico”. Pois, na verdade, o que acontecerá é a destruição
total ao longo do tempo de mais um remanescente da Mata Atlântica. Deve-se
promover a manutenção ou construção de corredores biológicos entre os
fragmentos florestais e, assim, permitir o intercâmbio gênico entre os
indivíduos. Criar um campo de concentração da flora e da fauna está fora de
questão e não encontra respaldo legal.
5. PROTEÇÃO LEGAL DO PARQUE ESTADUAL DA SERRA DA TIRIRICA
Do ponto de vista legal, a área do Vale do Córrego dos Colibris é considerada como Área de Preservação Permanente e Reserva Ecológica, pelos seguintes fatos e instrumentos legais:
a) A Constituição Federal em seu art. 225 § 4° Declara a Mata Atlântica e a Zona Costeira como Patrimônio Nacional. A cobertura vegetal da Serra da Tiririca está inserida na Mata Atlântica e também na Zona Costeira. Abrange duas categorias consideradas Patrimônio Nacional no mesmo patamar da Floresta Amazônica e o Pantanal Mato-Grossense.
b) O Decreto Federal n° 99.574/90 proíbe por prazo indeterminado, o corte e respectiva exploração da vegetação nativa da Mata Atlântica.
c) O art. 2º, da Resolução CONAMA n° 006/94, em seus § 2° e 3°, define a cobertura vegetal de Mata Atlântica, na qual está inserido o Vale do Córrego dos Colibris e toda a Serra da Tiririca, que se encontra em estágio médio e avançado de regeneração.
d) A Lei Federal n° 4.771/65 (Código Florestal) cria proteção para florestas e todas as formas de vegetação. Os seus arts. 1° e 2º estabelecem que:
Art. 1º As florestas existentes no território nacional e demais formas de vegetação, reconhecidas de utilidade às terras que revestem, são bens de interesse comum a todos os habitantes do País, exercendo-se os direitos de propriedade, com as limitações que a legislação em geral e especialmente esta Lei estabelecem.
Art.2° Consideram-se de
preservação permanente, pelo só efeito desta Lei, as florestas e demais formas
de vegetação situadas:
a)
ao longo dos rios ou
qualquer curso d’água desde o seu nível mais alto em faixa marginal cuja
largura mínima seja:
...
I- de 30 (trinta) metros
para os cursos d’água de menos de 10m de largura;
...
b)
nas nascentes, ainda
que sejam intermitentes e nos chamados olhos d’água, qualquer que seja a sua
situação topográfica, num raio mínimo de 50 (cinqüenta) metros de largura;
...
Parágrafo Único: Nos casos de áreas urbanas, assim entendidas as compreendidas nos perímetros urbanos definidos por lei municipal, e nas regiões metropolitanas e aglomerações urbanas, em todo território abrangido, observar-se-á o disposto nos respectivos planos diretores e leis de uso do solo, respeitados os princípios e limites a que se refere este artigo.
Esses dispositivos ainda estão em vigor, embora sob fundadas suspeitas de estarem ameaçadas pela Medida Provisória 1956/52, recentemente editada, e que traz modificações no Código Florestal. Por enquanto, pelos dispositivos do Código citado, a área do Córrego dos Colibris e do Brejo das Pacas, são Áreas de Preservação Permanente.
e) A Lei Federal n° 6.938/81, que instituiu a Política Nacional do Meio Ambiente, transformou em Reserva Ecológica as florestas e demais formas de vegetação de preservação permanente, relacionadas no art. 2° do Código Florestal. A área do Córrego dos Colibris e do Brejo das Pacas passaram a categoria de Reserva Ecológica, por força desta Lei.
f) Posteriormente a Resolução CONAMA n° 004/85 ampliou o conceito de Reserva Ecológica em seus art. 3° e 4°, que reforça ainda mais a proteção da área em questão. Esta mesma Resolução, em seu art. 5° atribui aos Estados e Municípios, a competência de estabelecer normas e procedimentos mais restritivos, através de seus órgãos ambientais.
g) A Constituição Estadual, em seu art. 265, define como Áreas de Preservação Permanente:
...
III – as nascentes e as faixas marginais de proteção de águas superficiais;
IV – as áreas que abriguem exemplares ameaçados de extinção, raros, vulneráveis ou menos conhecidos, na fauna e flora, bem como aquelas que sirvam como local de pouso, alimentação ou reprodução;
V – as áreas de interesse arqueológico, histórico, científico, paisagístico e cultural;
Por sua vez, o art. 270 determina que:
As coberturas florestais nativas existentes no Estado são consideradas indispensáveis ao processo de desenvolvimento equilibrado e a sadia qualidade de vida de seus habitantes e não poderão ter suas áreas reduzidas.
Por estes mecanismos legais, comprovados por estudos científicos recentes PONTES (1987, 1998), SOARES et al. (1995),TEIXEIRA (1993), TEIXEIRA et al. (1994), SANTOS (1999), GUIMARÃES et al. (2000), MOURA et al. (2000), PINTO et al. (2000), SOUSA et al. (2000), enquadram a área questionada e toda a Serra da Tiririca, como Área de Preservação Permanente.
h) A Lei Estadual n° 1901/91 criou o Parque Estadual da Serra da Tiririca, sendo o polígono da área de estudo (limites provisórios), definido conforme o Decreto Estadual n° 18.598/93. Neste Decreto, o Inciso I, trata da parte continental do Parque, onde diz:
“... prosseguindo pela cota 25 até encontrar o limite Leste do Condomínio Ubá Floresta, deste ponto segue em linha reta no sentido Leste até atingir a Estrada Engenho do Mato, seguindo por ela até atingir a Rua Y, continuando por esta até atingir a Estrada Celso Peçanha ...”.
De acordo com o Decreto, toda a área situada entre a Rua Y, na localidade conhecida como Bairro Peixoto – Itaipu, e a Serra da Tiririca, fazem parte do Parque Estadual, onde se inclui toda a área do Córrego dos Colibris e do Brejo das Pacas.
O IBAMA editou portarias referentes a fauna e a flora brasileira ameaçadas de extinção. A Portaria n° 1.522/89, em seu art. 1º torna conhecida a lista oficial de espécies da fauna brasileira ameaçadas de extinção e no art. 2° estabelece que os animais nela constantes gozam de proteção integral. A Lei Federal n° 5.197/67 (Proteção à Fauna) proíbe a perseguição e destruição de espécies da fauna silvestre em extinção. O art. 27º desta Lei, com a redação que lhe foi dada pela Lei Federal n° 7.653/88, torna esse ato em crime inafiançável. Desta forma a borboleta-da-praia (Parides ascanius), o gato-do-mato (Leopardus tigrinus), o gavião-pombo (Leucopternis lacernulata), o tucano-de-bico-preto (Ramphastos vitellinus) entre outros animais em extinção que ocorrem no Córrego dos Colibris têm proteção legal.
Em relação a flora, além dos dispositivos legais citados, a Portaria n° 006/92-N do IBAMA reconhece em seu art. 1º as espécies da flora brasileira ameaçadas de extinção, enquanto a Resolução CONAMA n° 001/86, em seu art. 6º, Inciso I, item b, que a comprovação de espécies ameaçadas de extinção em Área de Preservação Ambienta exige o Estudo de Impacto Ambiental e o Relatório de Impacto Ambiental (EIA/RIMA) para o licenciamento de qualquer obra naquela área. Estes instrumentos legais também se aplicam para a área do Córrego dos Colibris e do Brejo das Pacas, uma vez que está cientificamente comprovada a existência de espécies da fauna e flora ameaçadas de extinção.
Contudo, a proposta de modificação do Código Florestal traz polêmicos dispositivos que podem influenciar nestas determinações, com enfática discordância dos autores, pelo resultado nocivo que poderá provocar ao meio ambiente.
5. CONCLUSÃO
O Vale do Córrego dos Colibris é realmente de propriedade da VEPLAN, que hipotecou as terras ao BIAPE. É inquestionável seu direito de propriedade enquanto a empresa não for indenizada pelo Estado. Contudo, por tratar-se de área inclusa no PEST, tem seu uso restrito, visando excluir qualquer dano ambiental antrópico àquela área.
Não cabe ao BIAPE ou qualquer outra empresa que represente o proprietário empreender qualquer tipo de intervenção na área que está sob tutela do IEF/RJ. Seus usos serão definidos pelo Plano Diretor que também estabelecerá os limites definitivos do PEST.
De acordo com a análise detalhada de todos os pontos legais, já expostos anteriormente, juntamente com os aspectos ambientais envolvidos chega-se a conclusão que a liberação de licença para qualquer empreendimento imobiliário ou similar, na área do Córrego dos Colibris e Brejo das Pacas, no PEST, trará prejuízos ambientais irreparáveis e com desdobramentos nocivos e imprevisíveis, aos moradores de toda a região. Mas cabe ressaltar que a área goza de proteção legal especial, não podendo ser alterada ou destruída sob qualquer pretexto, pois estaria infringindo toda a Legislação Ambiental vigente no País, do Estado do Rio de Janeiro e do Município de Niterói. Uma vez que a referida área encontra-se averbada em cartório como Reserva Florestal, a mesma não é edificante.
Tamanha é a importância cultural e científica da região, que foi transformada em Parque Estadual em 1991, sendo reconhecido como Reserva da Biosfera pela UNESCO em 1992.
6. REFERÊNCIAS
BIBLIOGRÁFICAS
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p. 137.
[1] Bióloga - Mestre em Geociências e Professora Assistente da Universidade Estadual do Rio de Janeiro - UERJ/FFP DCIEN; Presidente da ONG Núcleo de Estudos Ambientais - NEA - Protetores da Floresta - Niterói - RJ.
[2] Advogado - Assessor Jurídico do Núcleo de Estudos Ambientais - NEA - Protetores da Floresta e Assessor Jurídico da Associação Pró-Fundação Universitária do Vale do Jequitinhonha - FUNIVALE; Coordenador do Projeto Expedição Spix & Martius - www.funivale.org.br
[3] Biólogo - Gerência de Unidades de Conservação da Secretaria Municipal de Meio Ambiente do Rio de Janeiro
[4] Desembargadora - Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro - Mestranda em Ciências Ambientais pela Universidade Federal Fluminense.